A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) é uma psicoterapia que vem atraindo muita atenção pelo seu caráter inovador, ao mesmo tempo que mantém uma base teórica sólida. Ela ela costuma ser classificada como uma terapia cognitivo-comportamental de terceira onda, ou seja, no mesmo campo de outras terapias comportamentais e cognitivas, mas com características específicas. Quais são esses aspectos que tornam a ACT diferente?
Vamos comparar a ACT com a TCC, ou terapia cognitivo-comportamental “convencional”, que foi desenvolvida ao longo dos anos por nomes como Albert Ellis, aaron T. Beck e com contribuições da psicologia comportamental. A TCC é considerada uma terapia de segunda onda e tem resultados bastante positivos para uma série de transtornos, sendo, até o momento a psicoterapia que mais possui base científica de seus ganhos com diversos transtornos.
1. A ACT é baseada numa filosofia diferente
Ao contrário da maior parte das outras psicoterapias, a ACT parte de um pressuposto filosófico diferente. Essa filosofia é chamada de contextualismo funcional. Nessa visão, não se pode avaliar nada que exista separando-se um elemento do seu contexto. Sejam pessoas, pensamentos, comportamentos, tudo é visto na função que exerce dentro de uma situação específica. Essa visão filosófica distinta pode parecer muito abstrata, mas faz toda a diferença na forma como a terapia funciona, como veremos a seguir.
2. A ACT não enxerga as pessoas, pensamentos ou emoções como disfuncionais
A TCC se apoia na ideia de que as psicopatologias existem porque certos conteúdos internos são disfuncionais, ou seja, não estão de acordo com a realidade externa. Esses erros de interpretação levam a sofrimento psíquico e atitudes “erradas”, que em última instância são vistas como patologias. A proposta terapêutica da TCC é, então, modificar a forma como o indivíduo vê o mundo e, consequentemente, mudar o seu comportamento para um mais adequado.
Já para a ACT, nada pode ser visto fora do seu contexto. Então, não faz sentido, nessa perspectiva, rotular pessoas, pensamentos ou comportamentos como disfuncionais, errados ou “patológicos” por si só. Ao contrário: na ACT, tenta-se entender para que eles servem, ou qual a função de qualquer coisa que a pessoa faça dentro do contexto que ela está. Além disso, leva-se em consideração, como critério para entender o quanto um comportamento está funcionando ou não, a vida que a própria pessoa valoriza. Os valores da pessoa são utilizados como critério de funcionamento, e não critérios diagnósticos.
3. A ACT não busca reduzir ansiedade ou qualquer outro conteúdo interno
Na TCC, entende-se que certos pensamentos ou emoções são disfuncionais, especialmente quando ocorrem em excesso ou trazem muito sofrimento para o indivíduo. Um dos objetivos da terapia, então, é reduzir essas sensações, como ansiedade ou pensamentos obsessivos, por exemplo. A ideia é trazer a pessoa para um nível de funcionamento que é considerado normal ou não patológico.
A ACT entende que o sofrimento faz parte da vida. Nessa visão, é totalmente natural se sentir ansioso, triste ou desanimado, dependendo do contexto. A ACT só verá esses pontos como problemáticos quando eles impedem a pessoa de viver a vida que ela considera significativa. Mesmo assim, a proposta não é a de reduzir essas sensações para que então a pessoa possa fazer aquilo que gostaria, mas sim abrir espaço para esses conteúdos de modo que eles não impeçam mais a pessoa de agir.
4. A ACT não busca mudar o conteúdo de pensamentos
A TCC procura combater pensamentos disfuncionais através de técnicas que apontem as distorções cognitivas, ou seja, o quanto uma pessoa interpreta de maneira errada a realidade. O pressuposto é o de que se a pessoa mudar a forma de pensar, mudará também o seu comportamento. Às vezes, o caminho contrário também é utilizado: através de estratégias comportamentais, busca-se criar consciência sobre a falta de acurácia dos pensamentos.
Na ACT, não se questiona o conteúdo dos pensamentos. Acredita-se que entrar num embate interno com a própria mente não traz uma solução definitiva. Propõe-se, então, uma mudança na relação que se tem com os pensamentos e outros eventos internos. Uma delas é a desfusão cognitiva, ou seja, o desenvolvimento de um eu observador que consegue notar o funcionamento da mente e fazer com que ela influencie menos os seus comportamentos.
5. A ACT procura promover uma vida mais plena e significativa
A TCC costuma ser orientada para a resolução de problemas psicológicos, ou seja, através de diagnóstico, levantamento de sintomas patológicos e sua correção através de técnicas comportamentais e cognitivas. Dessa maneira, pretende-se que a pessoa consiga funcionar melhor dentro daquilo que é visto como normal ou adequado.
Na ACT, a busca não é por resolução de problemas — até porque se entende que não há nada de errado a princípio — e sim por auxiliar a pessoa a viver mais próxima dos seus valores. Valores são qualidades que a pessoa gostaria que seu comportamento tivesse, como honestidade, dedicação, generosidade, coragem etc. Eles são o norte da terapia e são estabelecidos pela pessoa atendida, não pelo terapeuta. O papel da terapia é aproxima a pessoa de seus valores, ao mesmo tempo que trabalha maneiras de conviver com o sofrimento natural da vida.
Apesar das diferenças, ambas as terapias tem muito em comum: são terapias objetivas, ativas, ajustadas para a necessidade de cada indivíduo, progressivas e preocupadas com a fundamentação científica. O quanto uma será melhor do que a outra depende de cada pessoa, de suas preferências, do momento em que está vivendo e também da relação terapêutica. Uma boa relação terapêutica é mais importante do que a técnica.
O importante é ressaltar que ambas são terapias bem consolidadas e podem ser extremamente úteis no tratamento de dificuldades psicológicas e na promoção de uma vida melhor.